Sinto muito. É seguro dizer que a maioria de nós já usou essa expressão em uma tentativa de consolar o outro quando este aparece desconcertado ou aflito por algum acontecimento trágico. Porém, não é raro que estas palavras sejam seguidas de um desconforto que logo gera uma tentativa de desviar do ato de sentir. Não por mal, mas sim porque a maioria de nós não sabe o que fazer com os sentimentos que transbordam, principalmente com aqueles que fomos ensinados a considerar negativos.  Por isso logo nos apressamos em fazer com que eles desapareçam ou pelo menos suas manifestações.

Socialmente desenvolvemos o hábito de silenciar os sentimentos e os afetos. Quem nunca se viu impedido de chorar ou na tentativa de cessar o choro de alguém? Seja pedindo que a pessoa parasse de chorar, seja tentando fazer piadas para que o choro cesse, dizendo que não há necessidade de chorar ou até mesmo exigindo que a pessoa “engula o choro”. O mesmo pode ocorrer quando o choro vem de nós: – “não gosto de chorar na frente de outras pessoas, não quero incomodar”.  Aqui uso o choro como exemplo, mas o mesmo se dá com grandes alegrias e conquistas: aprendemos que não devemos compartilhá-las e devemos demonstrar apenas alegrias moderadas e conquistas advindas de muito trabalho duro e sacrifício. Trabalho este que deve ter foco na produção e, sentir, é contraproducente.

Sendo assim, o que temos é uma sociedade que valoriza amplamente a racionalidade em detrimento do sentir. “É preciso separar as coisas” nos ensinam e, mais tarde, somos nós a ensinar. Afinal, aprendemos que o que diferencia o ser humano dos outros animais seria precisamente a racionalidade, não é mesmo? Essa habilidade preciosa que faz de nós seres tão especiais. Na filosofia este modo de olhar a humanidade é muito bem sintetizado por Descartes no século XVII em sua famosa frase Cogito, Ergo Sum traduzida como “Penso, logo existo” ou “Penso, portanto sou”. Isto é, apenas por meio da razão, podemos viver nossa humanidade em sua máxima potência. Mas será mesmo que é assim?

Estar disponível para sentir certamente nos poupa de muitos problemas e até mesmo de doenças. Tentar evitar a tristeza a todo custo, pode levar a depressão. Quando não quero mais ficar triste e evito bravamente fazer contato com o que sinto, posso acabar ficando apática de maneira que poucas coisas sejam capazes de me mobilizar. Quando não me permito sentir raiva, como conseguir colocar limites? A raiva, tão marginalizada em nossa sociedade, pode ser construtiva e servir de combustível para o desenvolvimento de nossas potências quando bem utilizada.

Todo sentimento tem função e tentar fugir deles tende a adoecer nossa humanidade e nosso corpo. Te convido agora a experimentar algo bastante simples: não pense em um elefante branco. Neste momento, em hipótese alguma pense em um elefante branco…

Bom, sou capaz de apostar que o elefante branco ainda está figurando aí em sua mente. Quando tentamos nos impor não fazer contato com o que está presente precisamos de muita energia. Ao tentar fazer a sensação desaparecer, você vai perceber como ela ganha força e, talvez, seja o caso de se dar a mão e escutar o que aquilo que você sente tem a dizer e começar a se relacionar com seus afetos. Certamente estar em um processo terapêutico poderá ajudar e muito nessa retomada de contato consigo mesmo. Entender que seus sentimentos são válidos é também entender que você tem valor, que nem sempre você poderá estar disponível e que tudo bem. Saber seus motivos, conhecer a si mesmo, é um processo desafiador certamente, mas a cada pequeno passo será possível experimentar um pouco mais de autonomia, um pouco mais de você mesmo na relação com o mundo.

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